Bem Vindo a Nova York (Abel Ferrara, 2014)

Welcome to New York

Revisto, desta vez no cinema, o que ajuda a reforçar idéias e também jogar luz em algumas novas. O filme de Ferrara tem duas aberturas: uma entrevista encenada com Depardieu no qual ele responde sobre o porque aceitou o papel e uma cartela que esclarece que o filme foi inspirado no caso da prisão de Dominique Strauss-Kahn, mas é uma peça de ficção. Estão ali as duas personagens cujo imaginário domina a ação: Depardieu (e toda a carga que traz consigo hoje, tanto de seu passado como ator, mas também a da figura em desgraça pública hoje) e de DSK. O filme todo é carregado de informações, locações, pontas de figuras verídicas associadas ao caso. Muita informação, muito trabalho de pesquisa e toda uma pretensa autenticidade, só amplificada pelo corpo de Depardieu (exposto sempre) que entrega uma segunda verdade e associações tanto sobre a figura Depardieu como a DSK. O filme, porém, trabalha na direção de dissolver toda esta autenticidade em luz, formas, sombras. Se num filme como A Hora Mais Escura, a informação parece bastar como um valor em si, em Bem Vindo a Nova York ela é só um primeiro passo, a pretensa autenticidade é um ponto de partida que precisa ser superado para chegar numa ideia plena de representação. O filme tem três atos: um primeiro de ficção softcore, um segundo de processo policial-jurídico e por fim um terceiro de drama de câmara com Depardieu e Jacqueline Bisset a trocar acusações e rancores no apartamento que serve de sua prisão domiciliar. Nos dois primeiros, opera-se o tempo todo a partir da ideia de ir além da força documental (e diz muito sobre o gênio de Ferrara de que ele trate pornografia e o policial realista como oriundos de um mesmo processo) até chegarmos ao terceiro no qual a dramaturgia precisa se sustentar por si mesma, no qual não há saída a não ser confrontar aquela figura de frente. Busca-se a partir destes traços de Depardieu (e como já foi apontado é um filme sobre o ator, mas não propriamente sobre sua performance) e Strauss-Kahn, chegar a um mito cinematográfico que traz consigo bem mais do que o relatório de uma pesquisa bem feita sobre eles poderia apontar. Que o sr. Deveraux se revele mais um dos muitos vampiros sem empatia que povoam os filmes de Ferrara (um tipo que é bom dizer era mais comum quando trabalhava com o roteirista Nicholas St. John) não deixa de ser uma consequência inevitável no projeto estético do filme, a falta de empatia sempre foi o pecado maior nos filmes de Ferrara e como consequência o grande milagre do cinema sempre esteve em localizar em luz, cor, forma, uma maneira de se retornar ao mundo.

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