Recebo a notícia de que Irvin Kershner faleceu. Todos os obituários inevitavelmente se concentraram em ele ter dirigido O Imperio Contra Ataca, mas Kershner fez varios filmes muito interessantes entre as décadas de 60 e 70. O meu favorito é provavelmente Loving sobre o qual eu já escrevi algumas vezes aqui no blog e na Paisà. Aproveito para reproduzir o texto publicado na Paisà:
Em panoramas do cinema americano dos anos 70 é improvável que encontremos menções a O Amor é Tudo. Não se trata de um trabalho de um autor de peso (Kershner ainda é conhecido quase exclusivamente como o sujeito que dirigiu O Império Contra Ataca), e ao contrario da imensa maioria dos filmes mais famosos do período, não parece desesperado em se vender como um grande filme, nem possui os arrombos de intensidade de um Cassavetes, ou o gosto pelo inesperado de um Hellman ou do primeiro Rafelson. Parte do que valorizo nele nasce justamente daí, de ser um grande filme que chega lá por conta de um olhar atencioso, e sobretudo muita convicção no seu material.
Não gosto do título nacional, que tem um valor muito definitivo, o original (Loving) sugere um processo, um trabalho pesado, que me parece bem mais em sintonia com o filme. O título original também reflete a maneira como ele parece ter sido feito. Este é um daqueles filmes em que os envolvidos, o cineasta Kershner, o roteirista Don Devlin, o fotógrafo Gordon Willis e o astro George Segal, parecem ter percebido que há uma força muito grande no material e se lançam nele de maneira laboriosa e cuidadosa. É um filme bem simples: alguns poucos dias na vida de um ilustrador e seus problemas com a esposa, o trabalho, a amante, a garrafa.
O que torna Loving um filme essencial é a maneira como ele é exato na descrição dos sentimentos do seu personagem central. A frustração raramente é representada com tamanha precisão. Kershner e Segal delineiam à perfeição a relação que muitos que trabalham em áreas marginalmente ligadas a arte tem com seus empregos (no caso, um ilustrador de publicidade). Segal é ótimo em sugerir um estado constante de pânico moral e a parceria entre Kershner e Willis mapeia toda uma geografia sentimental (há uma seqüência perfeita em que Segal atende um telefone sentado no topo da escada e a distancia do seu corpo para a câmera sugere por um instante toda a relação daquele homem com seu mundo).
Para um filme quase desprovido de trama, O Amor é Tudo é surpreedentemente cheio de acontecimentos. Temos impressão que é mesmo trabalhoso manter a vida deste homem em pleno funcionamento, que ele esta ficando descuidado, e logo algo vai sair do lugar. Há uma grande inevitabilidade presente em todo o filme; mesmo assim quando o final embaraçoso surge, ele é doloroso, em especial seu corte final abrupto.